sexta-feira, 2 de julho de 2010

“A Ditadura Derrotada”

No último post, mencionei que a seleção brasileira se assemelhava a uma tropa de guerra e que o seu comandante demonstrava traços de um autoritarismo que, de uma maneira ou de outra, encontra respaldo em nossa cultura desde que traga algum tipo de benefício. Nos últimos três anos e meio a seleção ganhou tudo que disputou, menos as Olimpíadas e, agora, a Copa do Mundo. Com isso ganhou apoio. No entanto, com esta recente derrota, a tendência é que Dunga seja deposto. A ditadura de Dunga seja derrotada!
Não queremos cair no erro de misturarmos conceitos de Governo com Nação e, muito menos transformarmos a seleção brasileira em uma pátria de chuteiras, pois ela não é. Aliás, a vinculação do futebol e da seleção nacional ao aparelho ideológico do Estado foi algo muito forte durante a ditadura militar em nosso país. Coincidentemente, também foi um recurso discursivo usado por Dunga ao longo dos últimos três anos que esteve a frente da equipe brasileira.
No dia da convocação, por exemplo, o auxiliar técnico de Dunga, Jorginho, bradou que aqueles que criticavam o comandante não tinham amor a pátria e que, antes de se portarem como jornalistas, a imprensa deveria agir como brasileira. Apoiar a seleção fazia do cidadão comum, um pouco mais brasileiro do que os outros. “Brasil, ame-o ou deixe-o” foi um lema criado na época dos militares, mas que se encaixa perfeitamente ao treinador e sua seleção.
Justamente por isso, é muito interessante realizar um paralelo entre a trajetória da seleção de Dunga e a ditadura militar no Brasil. Ressalvamos que este é um exercício puramente alegórico e que sacia a curiosidade do blogueiro e nada mais. Mesmo assim, as nuanças da comparação são realmente muito cativantes e, por isso, seguiremos com elas. Vamos lá: Assim como o Regime Militar, Dunga chegou ao “poder” para combater a anarquia, a desordem e os desvios morais pelos quais passavam o país e a seleção. Assim como os militares que, em nome da família e da propriedade defendeu os brasileiros do perigo comunista, o treinador brasileiro assumiu a missão de acabar com a desorganização, a falta de comando e as farras organizadas durante a Copa da Alemanha em 2006. Ironicamente, ambas perseguiram veementemente a imprensa.
Ao longo de seu desenvolvimento, ambas se apegaram firmemente ao discurso do patriotismo ufanista, vinculando sua imagem à falsa representação cabal da Pátria. No caso da Ditadura, os primeiros anos de governo encontraram o respaldo da sociedade, como no evento da Marcha da Família com Deus pela Liberdade que congregou centenas de milhares de pessoas pelas ruas brasileiras em prol do governo que então se erguia. Durante essa Copa, Dunga atingiu o auge de sua aprovação, principalmente após o episódio “Escobar” como comentado anteriormente aqui.
No entanto, o respaldo aos dirigentes autoritários é condicionado aos bons resultados. Com o fim do Milagre Econômico e com o agravamento dos problemas econômicos, a ditadura começou a dar margens a manifestações e a movimentos de contestação. Este foi um processo de anos que levou os militares a uma revisão quanto a participação da sociedade civil e do mundo privado para o desenvolvimento do país que culminaria com a redemocratização ainda na década de 1970. No caso de Dunga, este processo foi muito mais imediato: durou somente os 45 minutos do segundo tempo do jogo contra a Holanda. Dunga deixou os 69% de sua aprovação para sumir em meio ao coro de “burro” que já ecoa pela mídia e pelas redes sociais.Assim como a Ditadura Militar, Dunga foi derrotado e agora encontra-se encurralado, como na coleção de Élio Gaspari sobre os “anos de chumbo” em nosso país. Esperamos que em seu lugar erga-se um comando técnico que consiga implantar autoridade sem ser autoritário e que não seja apenas uma marionete na mão dos poderosos interesses midiáticos e econômicos. Ou seja, algo bem diferente daquela democracia que se ergueu em nosso país e que ainda segue em busca de ser efetivamente democrática.